12 outubro 2006

Finanças locais

O ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, defendeu, na Convenção Autárquica dos socialistas do Porto, que a nova Lei das Finanças Locais vai obrigar os autarcas a "maior eficácia", fazendo-os privilegiar os melhores projectos e não os que podem render mais votos.
"Com este novo enquadramento, vamos criar condições para que o exercício dos poderes regionais e locais seja feito com maior eficácia. Governar bem não é fazer tudo o que queremos, é escolher, dentro das limitações que temos. Isto obriga que afectemos os recursos aos melhores projectos, não a projectos faraónicos, para impressionar eleitores", defendeu o governante.
É pois, clara a desvalorização à posição assumida pelos autarcas que, em recente congresso extraordinário, rejeitaram a nova lei.
Face a tamanha contestação, também o Notícias de Ourém quis compreender e ajudar os nossos leitores a perceber o que está em causa.
Começamos por falar com um deputado do concelho que é, ao mesmo tempo, redactor do relatório da lei na Comissão de Orçamento e Finanças.
Trata-se de António Gameiro que começou por manifestar a sua concordância com a lei que considera «positiva, no sentido em que revoga um regime que toda a criticou, porque muito expansivo, da acção dos municípios, por exemplo, ao nível dos endividamentos». Por outro lado, afirma Gameiro, esta lei «aprimora critérios. Não acentúa apenas critérios de equidade territorial mas também populacionais e de desenvolvimento». Por isso, para o deputado, a lei «é positiva porque cria um quadro financeiro estável e descentraliza competências para os municípios, na área fiscal, pela primeira vez». Como exemplo refere os três por cento de IRS de que os municípios passam a dispor e diz que estes podem ajudar a fixar população. Por exemplo, se a autarquia decidir abdicar deles em favor do contribuinte que vive no seu território.
No entanto Gameiro reconhece que, sendo «uma lei possível, ela não é a ideal. Considera que «poderíamos fazer uma lei mais concertada com os autarcas», mas, defende, «também é verdade que era tempo de haver uma lei que pusesse fim ao regabofe do endividamento municipal», considerando a necessidade de «uma gestão mais criteriosa».
No que se refere ao concelho de Ourém, Gameiro recorda que dos cerca de 500 mil contos que recebia no final dos anos 80 e anos 90, o concelho passou a receber, a partir de 1997, um milhão e duzentos mil contos. Ou seja, tem vindo em crescendo e a situação vai manter-se. Ou seja, Ourém será dos concelhos que vai ser beneficiado com a nova lei, passando a receber uma verba maior. Para isso, contudo, terá que cumprir as regras. Isto quer dizer que, em 2007, o concelho não poderá ultrapassar 1.25 da sua capacidade e endividamento. Se o fizer, no ano seguinte, é-lhe descontado 10% do montante de endividamento o que, em muitos casos, e em Ourém também, é mais do que aquilo que teria a receber. Ou seja, uma autarquia nesta situação acaba por não receber nada. O caso de Ourém é complicado exactamente pela construção do novo edifício dos Paços do Concelho que obrigarão ao aumento do endividamento eu, naturalmente, com facilidade, ultrapassará os tais 1.25 e consequente castigo, no ano seguinte.
Gameiro reconhece alguma enfermidade da lei nesta área porque a proximidade temporal é grande e os investimentos já em curso poderão ser altamente penalizadores. Por isso espera que a discussão na especialidade permita concertar algumas posições e trazer resposta a algumas preocupações dos autarcas.
Principais
inovações da Lei
A nova lei aponta um «reforço da autonomia local» através da participação directa dos municípios em 5% do IRS, sendo que 2% correspondem a uma parcela fixa a que todo os municípios têm direito e 3% correspondem a uma parcela variável, definida pelos municípios, que podem decidir quanto querem cobrar, entre 0 e 3%, e assim aliviar, ou não, os seus munícipes – contribuintes.
Aponta o Fundo Social Municipal como um fundo «destinado exclusivamente a financiar competências transferidas para os municípios nas áreas da educação, saúde e acção social, que passam a prestar serviços públicos essenciais aos seus munícipes, promovendo a igualdade de acesso a esses serviços».
Há a «possibilidade de cobrança dos impostos municipais pelas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e pelas associações de municípios».
Por outro lado considera-se existir um reforço da autonomia dos municípios na concessão de isenções fiscais relativamente ao IMI, IMT e IMV. A Assembleia Municipal, por proposta da Câmara, pode conceder isenções totais ou parciais relativamente aos impostos municipais. E caso o estado decida conceder isenções fiscais, terá que ouvir o município e, se este se opuser, é obrigado a compensá-lo.
Os municípios podem criar taxas, através de actividades municipais e/ou da realização de investimentos.
Combate ao défice
Nenhum município poderá ver as suas transferências descerem mais do que 5 ou 2.5%, conforme a sua capacidade fiscal; do mesmo modo também não verá as transferências aumentarem mais de 5%, já que os crescimentos acima revertem para o Fundo de Coesão, em solidariedade com outros municípios.
A nova lei ajusta o FEF – Fundo de Equilíbrio Financeiro ao ciclo económico. Ou seja, os municípios verão as suas transferências do OE crescerem quando as receitas fiscais estiverem em crescimento no país e vice-versa. Defende ainda o enunciado da proposta que «às participações através do FEF e da participação no IRS, temos de adicionar as receitas de IMI e IMT» que considera estarem «em franco crescimento».
Quanto ao endividamento, impõe-se grande rigor. O novo limite global é de 125% das receitas mais importantes do município (FEF + participação no IRS + Impostos Municipais (IMI; IMT e IMV) + derrama + lucros das suas empresas municipais, relativas ao ano anterior). Neste limite, incluí-se qualquer tipo de dívida: empréstimos, dívidas a fornecedores, cessão de créditos, leasings, etc. Um limite ao endividamento através de empréstimos de médio e longo prazo é igual a 100% das mesmas receitas.
A posição dos autarcas
Rejeitando a proposta de lei, a ANMP – Associação Nacional de Municípios Portugueses afirma não entender o que considera ser uma «obsessão» do Governo pelo endividamento municipal quando, esclarece, «a dívida dos municípios é de apenas 5% da dívida total da administração pública». Acusa a proposta de apresentar medidas inconstitucionais e como exemplo referem a possibilidade dos municípios disporem dos tais 3% do IRS dos cidadãos «quando, na restante fatia de 95%, que são receitas da administração central, o governo não tom qualquer iniciativa para baixar esse mesmo imposto». Acredita a associação que «a diminuição de verbas poderá levar dezenas de municípios a situações de insolência e acusam a lei de por em causa o principio de autonomia local que aufere aos municípios a liberdade de condução das políticas públicas municipais.


Na reunião da passada segunda-feira, a Câmara de Ourém tomou posição sobre a nova lei. Houve unanimidade mas os vereadores do PS apresentaram declaração de voto.

A posição de Ourém

Decorreu no passado dia 04 de Outubro o XVI Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) sobre a proposta de Lei das Finanças Locais. Em resultado da análise do referido documento os autarcas presentes decidiram rejeitar a proposta, lamentando o retrocesso da autonomia do poder local e o reforço do centralismo que dela decorrem.
Foram identificadas na proposta de Lei cinco grandes questões que segundo os autarcas irão afectar gravemente o futuro do Poder Local em Portugal:
- Limitações à autonomia municipal;
- Auto-suspensão da própria lei, se aprovada, diminuindo o montante global da participação dos Municípios nos impostos do Estado;
- Inconstitucionalidade na participação variável dos Municípios até 3% do IRS;
- Critérios caóticos de distribuição de verbas entre Municípios;
- Limites de endividamento, acompanhados de amortizações obrigatórias e imediatas.
Nesta sequência e conforme solicitação da ANMP a Câmara de Ourém em reunião realizada na passada segunda-feira dia 09 de Outubro, deliberou, por unanimidade, rejeitar a referida proposta de Lei das Finanças Locais, face à perspectiva de, num futuro próximo, muitos dos municípios não poderem cumprir minimamente os padrões de qualidade de vida que o Poder Local já proporcionou à generalidade dos portugueses. Os eleitos locais decidiram em face também à situação inerente ao Município de Ourém, nomeadamente após uma análise comparativa à evolução legislativa em matéria de endividamento municipal, chegando-se às seguintes conclusões:
· Lei das Finanças Locais em vigor (Lei 42/98 de 06 de Agosto) – Utilização de 49,82% da capacidade de endividamento;
· Lei do Orçamento de Estado para 2006 – Utilização de 99,64% da capacidade de endividamento;
· Proposta de Lei das Finanças Locais (com as excepções previstas) – Utilização de 197,25% da capacidade de endividamento.
Note-se que os municípios que excedam o limite de endividamento líquido, devem reduzir, em cada ano subsequente, pelo menos 10% do montante que excede o limite.
A Câmara de Ourém manifestou ainda que, a ser aprovada a presente proposta de Lei, a qual altera as regras "a meio do jogo", o futuro do concelho ficará seriamente comprometido, em face aos objectivos de desenvolvimento que todos pretendemos.


Declaração de voto do PS

Comungamos muitas das preocupações expressas no Relatório da ANMP sobre a nova Lei das Finanças Locais e da necessidade de se encontrar um figurino que permita às autarquias locais continuar a responder da melhor forma ao desenvolvimento e qualidade de vida das suas populações.
As maiores preocupações dos municípios prendem-se, no entanto, com os limites de endividamento que vem comprometer muito do que se propunham realizar nos planos plurianuais e mesmo para além deste mandato autárquico.
No caso do município de Ourém esta preocupação com os limites de endividamento atinge proporções alarmantes e compromete seriamente os investimentos a realizar nos próximos anos.
Entendemos no entanto que a nova lei das Finanças Locais não se limita a fixar novas regras de endividamento municipal e tem mesmo algumas virtudes quer quanto à necessidade de transparência e verdade das contas públicas, quer quanto aos critérios na distribuição de verbas pelos municípios. No momento em que se pede a todos e especialmente às famílias um esforço de contenção e de sacrifício para diminuir o défice público, também os municípios são chamados a participar sem que a sua autonomia possa ser posta em questão.
Entendemos ainda que haverá condições para promover ajustamentos e correcções a esta lei quando da discussão na especialidade na Assembleia da República.
Os Vereadores do PS na Câmara de Ourém

Sem comentários: