- Cerca de 50% dos incêndios florestais deflagrados em cada ano, têm origem humana negligente, cabendo recordar que essa negligência é punida criminalmente, com penas que se poderão alongar a 5 anos de prisão.
- As suas causas mais comuns situam-se no uso incorrecto e indiscriminado do fogo (tanto para efeitos acessórios de lazer, como na produção das vulgarmente designadas "queimadas") e no lançamento de pontas de cigarro acesas sobre combustíveis finos e secos.
- Cerca de 25 a 30% dos fogos florestais revestem origem criminosa voluntária, sendo maioritariamente motivados por instintos de vingança ou de mero vandalismo.
Afinal não há conspirações e nem crime organizado na questão dos incêndios. Quem o afirma é a própria Polícia Judiciária que garante não existirem quaisquer provas daquilo que é habito ouvir-se todos os anos quando começam os fogos de Verão.
Mais, os fogos causados por incendiários não são provocados por pirómanos. É que a piromania é uma doença e não há tantos doentes assim no nosso país.
Quais são então as causas de tantos fogos?
Foi para explicar isso e muito mais que a Polícia Judiciária organizou na quarta-feira, dia 24, em Coimbra, um encontro com jornalistas, que contou com intervenções de especialistas nas áreas da psicologia e da investigação, subordinado ao tema «Fogos Florestais: crime ou notícia?».
A coordenar os trabalhos, o Director Nacional Adjunto da PJ na Directoria de Coimbra, apontou «a complexidade do tema» como motivo de tal encontro.
Pedro do Carmo apontou vários números «para que se tenha uma ideia, ainda que aproximada da dimensão do fenómeno».
Assim, em 2005, foram investigados pela PJ, 2122 incêndios florestais, o que representou um acréscimo do número de incêndios relativamente aos quais existem indícios de autoria dolosa de cerca de 25%. Mas se recuarmos a 2001, esse aumento é de 200% em apenas cinco anos.
Porém, as conclusões da PJ são que não existe uma relação directa entre o número de ocorrências, a área florestal ardida e o número de situações em que existem suspeitas de autoria dolosa. E, a ser assim, há que introduzir outras variáveis como são as condições atmosféricas, os valores de humidade do solo, o tipo de ordenamento florestal e humano, o ordenamento da floresta, o maior ou menor rigor na distinção entre incêndio e reacendimento ou a forma como foi evoluindo a valoração dos eventuais indícios de acção humana dolos na origem do fogo. Ou seja, de facto, haveria muito menos incêndios se muitos deles não fossem de origem criminosa. Porém, a conduta criminosa apenas representa uma parte do problema, pelo que a sua repressão apenas representa, também, uma parte da solução.
E parta a PJ não há qualquer prova da existência de uma rede criminosa nacional ou internacional como se tem feito circular. «A realidade», afirma Pedro do Carmo, «tem-se revelado, perante os investigadores, completamente diversa». Segundo este responsável, «salvo situações absolutamente excepcionais, o autor do crime de incêndio florestal age sozinho» e a motivação económica não existe senão num número muito limitado de situações.
Pedro do Carmo é claro: não se trata de incapacidade em demonstrar a existência de tais redes criminosas ou interesses organizados, mas antes a conclusão peremptória de que tais redes ou interesses não existem.
Defende, e isso é depois confirmado través das intervenções dos especialistas na matéria, que na «esmagadora maioria dos casos» as causas por detrás dos incêndios florestais provocados criminosamente, se devem a motivos insignificantes ou fúteis como vingança, vandalismo, curiosidade, melancolia, solidão, divertimento, «de tudo encontramos um pouco» afirma.
E dá exemplos de inquéritos investigados na região centro. É o caso do jovem vigia florestal que, tendo medo de estar sozinho na sua torre, provocou vários incêndios nas proximidades para poder ter companhia dos bombeiros que os vinham combater; do comerciante que, rejeitado pela esposa, lança fogo ao pinhal existente nas traseiras da sua casa na esperança de despertar pena na mulher e a possível reconciliação; é o jovem revoltado porque o pai não lhe comprou um computador que decidiu provocar um incêndio ou ainda o caso do indivíduo que, interrogado, afirmou ter provocado o fogo para aparecer na televisão.
Ora, afirma Pedro do Carmo, nenhum destes, bem como muitos outros casos investigados, se encaixam no estereótipo do indivíduo que, a soldo de gente importante, lança fogo ou do avião que bombardeia a floresta com elaborados dispositivos incendiários. Para este responsável, «a realidade é bem mais simples» e «é composta, na sua maioria, por gente simples, de cuja existência, as mais das vezes, só nos lembramos quando lhe ardem os bens ou quando ela mesma lhes lança o fogo». Ora, esta simplicidade acaba por se traduzir numa muito maior dificuldade de investigar o que se agrava pelo facto do incendiário, em regra, procurar locais ermos e horas sem movimento para provocar o fogo. Também os meios utilizados para a deflagração são bem mais simples que aquilo que muitas vezes se ouve e não passa de fósforos, isqueiros ou velas. Daí a dificuldade de investigação mas, apesar disso, refere o director nacional adjunto da PJ, «nos últimos anos temos assistido a significativos avanços na investigação criminal, quer ao nível da melhoria dos mecanismos de cooperação entre todas as entidades envolvidas na prevenção e repressão dos incêndios florestais quer ao nível do conhecimento científico e utilização de nova tecnologias». Avanços estes, que levaram a que, só no ano passado, na Directoria de Coimbra, tenham sido constituídos como arguidos 273 suspeitos entre os 637 inquéritos iniciados, tendo em conta que muitas vezes um único arguido é autor de vários incêndios.
Em jeito de síntese, Pedro do Carmo atestou que «a maior parte dos incêndios florestais não são dolosamente provocados»; que «não é possível estabelecer uma relação de proporcionalidade directa entre o número total de incêndios, o número de incêndios dolosamente provocados e a dimensão da área ardida»; que «nos casos em que o incêndio é intencionalmente provocado, deparamo-nos, com regra quase sem excepção, com um agente do sexo masculino, que actua sozinho e sem motivo relevante que o conduza a esse comportamento»; que «apesar das dificuldades existentes, a investigação do crime de incêndio florestal tem produzido resultados positivos, traduzidos no número de arguidos constituídos, na percentagem de aplicação da medida de coação prisão preventiva, no número de condenações, nas penas de prisão aplicadas e respectiva duração» e que «por muito dura ou eficaz que seja a repressão criminal, o seu impacto nunca ficará aquém das expectativas».
O perfil do incêndiário
Cristina Soeiro, professora do Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais, fez uma caracterização sócio-psicológica do incendiário florestal português.
Segundo a docente a maioria dos incendiários florestais são do sexo masculino, têm baixa escolaridade, pertencem a famílias de nível sócio-económico baixo. Para além disso apresentam, por norma, problemas associados ao alcoolismo, agem individualmente e têm motivações fúteis.
Geralmente actuam por retaliação, em benefício próprio ou têm uma história clínica relacionada com alcoolismo, atraso mental e esquizofrenia. Menos frequentes são os casos em que agem por atracção pelo fogo, ou seja por piromania. Com base nas investigações existentes é possível traças diferentes perfis do incendiário, sendo que os mais comum apresentam as características enunciadas Os que actuam por retaliação, são os mais comuns e pode tratar-se de homem ou mulher, entre os 36 e os 45 anos ou com mais de 56, casados, operários não especializados, desempregados ou reformados com pouca escolaridade, apresentando problemas de alcoolismo, na generalidade sem condenações anteriores. Actuam entre as 16 e as 20h00 e por motivos de hostilidade e/ou de raiva contra familiares e conhecidos.
Frequentes também, embora menos, são os que actuam por razões de ordem psiquiátrica (esquizofrenia, atraso mental) ou por efeitos do álcool. Geralmente são também indivíduos do sexo masculino, entre os 46 e os 55 anos, que exercem profissões como as de bombeiro, pastor, madeireiro, etc., e sem escolaridade. Apresentam antecedentes psiquiátricos e/ ou consumo no momento do crime. As horas a que ocorrem estes crimes situam-se, geralmente entre a meia-noite e o meio-dia ou entre o meio-dia e as 16. As causas são, geralmente, de origem passional, frustrações, resultantes da patologia e os alvos são amigos ou companheiros.
Seguem-se os que actuam em busca de benefício próprio. São homens entre os 20 e os 35 anos, operários ou comerciantes, com baixa escolaridade, sem antecedentes psiquiátricos que não consomem álcool no momento do crime e que podem ter condenações anteriores por outros crimes. Actuam por volta das 20h00 em áreas florestais ou agrícolas. Neste perfil podem incluir-se aqueles que recebem um pagamento pelo crime.
Pouco frequente é o caso dos pirómanos. Trata-se, na generalidade de homens com menos de 20 anos, solteiros que cometem o crime por prazer em destruir e fazem-no perto dos locais de emprego. Ateado o fogo, voltam depois com os bombeiros, muitas vezes ajudando mesmo no combate ou simplesmente para observar.
Face a estes perfis, a especialista alertou para o facto de nem todos estes indivíduos terem capacidade de aprender a alterar comportamentos apenas através da repressão.
António Carvalho, inspector chefe da PJ, apontou o grupo etário entre os 20 e 35 anos como sendo responsável por 40,6 por cento dos incêndios, sendo que os indivíduos entre os 36 e 45 anos e os 46 e 55 anos surgem, em cada um dos casos, com 21,9 por cento.
Este responsável da PJ alertou para a diferença entre fogo e fogacho sendo que das 35.763 ocorrências registadas no ano passado, apenas 8086 são consideradas como fogos florestais porque queimaram mais de um hectare de floresta. Todos os outros 27677, com menos de um hectare, são considerados fogachos e mesmo neste último caso, a maioria não ultrapassa uma área de 100 metros quadrados.
António Carvalho explicou depois o modo como a PJ desenvolve uma investigação: a metodologia, o ciclo da investigação, a identificação do ponto de início do fogo e, finalmente, o objectivo da investigação.
Não ficaram esquecidas as recomendações, em termos de prevenção ficando claras as ideias de que as queimadas são cada vez mais perigosas visto que os espaços agrícolas que funcionavam como barreiras, são cada vez menores. Alertou para a necessidade de se proceder à limpeza em torno das casas e para o perigo que representam as lixeiras clandestinas e as sucatas abandonadas.
A última intervenção foi da responsabilidade de Rui Abrunhosa, professor na Universidade do Minho que falou do impacto do tratamento noticioso nos comportamentos. Não ficou provado que o visionamento de imagens televisivas influencie comportamentos, de per si. Mas ficou a certeza de que se o indivíduo tiver propensão para a violência. Mas também ficou claro que depende muito da forma como é feito o tratamento noticioso. É que, por vezes, um comportamento condenável acaba por se tornar numa banalidade e aí reside o maior perigo, sobretudo para indivíduos com dificuldade em assumir determinados sentimentos como a culpa ou o remorso. Isto é válido, sobretudo se tivermos em conta os perfis traçados que dizem que o incendiário, na maior parte dos casos, sofre de doença de foro psiquiátrico, possui um nível de inteligência baixa e/ou consome álcool ou drogas.
Tudo a postos no distrito
Falar de preparação para a época de incêndios, obriga a ouvir o responsável máximo pela protecção civil no distrito, o seu Governador Civil. Para o oureense Paulo Fonseca, o distrito «está a postos e preparado»
Notícias de Ourém - Estamos em plena época de incêndios. Como é que o distrito está preparado?
Paulo Fonseca - Sejamos claros. Estamos muito melhor preparados mas ainda não estamos como deveríamos estar. Basta pensarmos no grande problema estrutural que é a falta de ordenamento florestal para percebermos que falta fazer muito, principalmente ao nível da mentalidade. Se temos milhares de parcelas com mato da altura de uma pessoa é muito difícil aos Bombeiros poderem ter uma eficácia plena. Se temos pessoas que insistem na ideia de fazer queimadas ou mandar foguetes à hora do calor, em pleno verão compreendemos bem a dificuldade que é podermos corresponder a 100 %.
NO - Quais as principais diferenças em relação a anos anteriores?
PF -Reforçámos os meios aéreos – temos agora mais um avião de combate no Distrito, já a operar nesta fase, para além de um avião de vigilância que resultou de um protocolo que eu mesmo assinei com a Vodafone e a partir de 1 de Julho contaremos com mais um avião de combate. Introduzimos brigadas de ambiente da GNR no dispositivo de combate e estamos a equipar os Bombeiros com equipamentos de protecção individual em número suficiente, isto com verbas do Governo Civil. Deixámos de ter somente o Comandante Distrital, tendo reforçado o Comando com a designação do Eng.º Rui Natário para 2º Comandante e demais instituições; reforçámos o sistema de comunicações que é o mais avançado do país até à implementação do SIRESP; dotámos as viaturas de comando com GPS. Fizemos 35 reuniões por todo o Distrito para estimular a criação de Zonas de Intervenção Florestal (ZIF’s) na convicção de que é o melhor caminho para resolver o deficiente ordenamento da floresta; reforçámos em 25 por cento as equipas de primeira intervenção em todo o Distrito de Santarém, etc.
NO - O dispositivo de combate está todo a postos, inclusive o aéreo?
PF - Estamos a postos e todos os intervenientes estão preparados para enfrentar esse inimigo comum que é o fogo. Temos bons Bombeiros, mais e melhores equipamentos, inclusivamente meios aéreos, uma unidade colectiva em torno desta estratégia que foi desenvolvida pela primeira vez no Inverno e que nos possibilita ter a ambição de sermos mais eficazes. Mas continuamos com os problemas estruturais que referi para além de se adivinhar um aumento gradual da temperatura média devido à tentação de destruição ambiental de décadas e à redução da humidade relativa que faz aumentar a velocidade de propagação do fogo e a dificuldade no seu combate.
Sobre os meios aéreos, aproveito para desmistificar uma ideia errada pois é absolutamente impossível um combate com recurso aos meios aéreos se o fogo tiver uma dimensão muito grande pois o fumo inviabiliza essa possibilidade. O reforço de meios que temos permite, isso sim, uma resposta mais rápida na primeira intervenção, procurando evitar o aumento da dimensão do fogo.
NO - Existe algum plano específico de detecção e combate, diferente daquilo que já é conhecido de outros anos? Especifique.
PF - Existe o Dispositivo Distrital que se insere no Dispositivo Nacional e que se constituem nos Planos de Prevenção, Detecção e Combate aos Fogos Florestais, mais apurado que o plano do ano anterior, desde logo pela introdução das diversas novidades que se conseguiram obter. Por exemplo, a Coordenação da Detecção e Vigilância é feita pela GNR, por exemplo o reforço das equipas de primeira inter-venção….etc.
NO - Os meios existentes são os mesmos? Há mais? Há menos?...
PF - Como acima referi, existe um substancial reforço de meios bem como uma estratégia mais adequada às dificuldades que possuímos.
NO - Como se vai estabelecer a relação entre as forças da GNR e os bombeiros. Quem coordena o quê, quem é responsável por o quê? Ou seja, como é que as coisas se vão desenrolar no terreno?
PF - O Comando Distrital coordena todo o sistema e é o principal responsável por ele. Todas as restantes estruturas se enquadram no dispositivo sob a tutela do Comando Operacional que responde perante o responsável político.
No - Desde a abertura oficial da época de incêndios, a 15 de Maio, já é possível dizer o que é que ardeu no distrito?
PF - Até agora ardeu muito pouco, felizmente. O objectivo é reduzir o número de ignições e a área ardida.
NO - Quer deixar alguma mensagem final?
PF - Aproveito para dizer que todos os cidadãos são agentes de protecção civil pelo que é exigível que cada um defenda os seus bens, as suas casas, com uma limpeza significativa dos matos envolventes. Assim como pedir que seja cumprida a Lei no que se refere ao uso dos foguetes ou à realização de queimadas… A verificar-se tal irresponsabilidade, o trabalho dos Bombeiros torna-se muito mais difícil e não teremos qualquer problema em intervir a sério contra estes infractores.
Por outro lado, um apelo forte para que os proprietários se organizem na criação das ZIF’s… É a única forma de se organizar a floresta tornando-a rentável e permitindo a defesa do património de todos… E, provavelmente pela última vez, existem apoios financeiros do Estado para apoiar a criação destas entidades.
GNR também a postos
Algumas dúvidas têm surgido quanto às novas competências atribuídas à GNR no que se refere à prevenção de fogos florestais. Nesse sentido o NO foi procurar esclarecer-se junto de fonte bem informada. De facto, a GNR tem competências nas áreas de detenção e vigilância florestal. Como é sabido, os guardas florestais passaram a integrar os corpos civis da GNR e estão a fazer vigilância, com o CEPNA - Corpo Especial de Protecção da Natureza da GNR, em constante contacto com os postos de vigia. Por outro lado, existem elementos de ligação da GNR que têm permanência nos Bombeiros (CDOS - Centro Distrital de Operações de Socorro) e que cobrem toda a área florestal através de câmaras e fazem a detecção visual dos incêndios. Ou seja, por parte da GNR está tudo a postos para a chegada do Verão e dos incêndios. De referir ainda que tem estado a decorrer reuniões diárias com o coordenador distrital para acerto de pormenores, colaboração, etc. No entanto, há também que referi-lo, para a GNR este é um ano piloto, pelo que as novas metodologias ainda não foram testadas.
Intermarché oferece mais segurança
Realizou-se no passado dia 26 de Maio, no Intermar-ché do Cartaxo a cerimónia de entrega a 5 Corporações de Bombeiros do País, entre as quais os Bombeiros de Ourém, de equipamento individual de segurança – Fatos NOMEX.
Esta iniciativa teve o patrocínio em parceria do Intermarché e Lever & Elida Portugal que promoveu esta campanha junto dos clientes do Intermarché
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