28 setembro 2006

À mesa com o Medieval



O vinho Medieval de Ourém esteve em estaque num jantar promovido, na passada sexta-feira, pela VitiOurém com o objectivo, essencialmente, de agradecer a muitos dos que se envolveram neste processo, que teve em vista a dignificação deste vinho, único pelas suas características.
A ementa, composta por pratos tradicionais, foi da responsabilidade de Marques da Cruz, uma personalidade ligada ao vinho e à gastronomia tradicional e o jantar teve lugar no restaurante medieval, no castelo de Ourém.
No início, o engenheiro agrónomo e enólogo Luís Mendes explicou as razões da especificidade do vinho de Ourém que lhe advém dos métodos de vinificação herdado dos monges de Cister, na Idade Média. Recorda o enólogo que estes monges, oriundos de Borgonha, vieram instalar-se em Alcobaça e era nas suas abadias que os agricultores prensavam as uvas brancas, transportando-as depois para as suas casas onde faziam pisavam as uvas tintas que aí vinificavam e eram depois misturadas com o mosto branco trazido das abadias. Ou seja, «tingiam o vinho», daí que ainda hoje em Portugal se utilize a designação de vinho tinto e não vermelho como noutros países (red wine em inglês ou vin rouge em francês, por exemplo). É só no século XX que em Portugal surge o tal vinho que deveria ser designado como vermelho mas que assume o nome de tinto.
Luís Mendes lamenta que o consumidor português, em geral, não dê importância à questão do regulamento dos vinhos, como acontece noutros países, já que assim se daria, muito melhor, conta da qualidade do produto. Daí que considere um desafio interessante a possibilidade do vinho de Ourém vir a ser uma aposta no mercado francês, onde as pessoas se preocupam com os regulamentos pelo que o vinho poderia vir a ser colocado junto das elites de consumidores, ao mesmo tempo que a aposta passaria também pelo grande número de portugueses que habitam aquele país.
Neste jantar esteve presente o Director Regional de Agricultura do Ribatejo e Oeste, António Rego, e o presidente da Comissão Vitivinícola Regional da Estremadura, João Ghira. Este último congratulou-se com o facto de se estar ali já a provar um conjunto, ainda pequeno, de vinhos já engarrafados e devidamente reconhecidos. Reconhece que «este vinho tem uma especificidade que foge às características do VQPRD» e daí a necessidade de lhe dar um enquadramento diferente pelo que atribui o mérito à VitiOurém no desenvolver do processo que agora se inicia e que entende, não será fácil. Refere a necessidade de ter a «noção das dificuldades que o sector atravessa face à concorrência nacional e internacional e à redução do consumo». Por isso, defende, há que apostar na qualidade e recorda que o vinho «não é apenas um alimento, um produto comercial ou fonte se prazer». Ele é também cultura e no caso de Ourém, ele é testemunho de uma «cultura multissecular, com uma tecnologia muito própria» e deve sair por aí que ele deve ser divulgado. Refere ainda ser importante que «a restauração da região tenha consciência da importância deste produto e do que ele pode representar».
Também o presidente da Câmara de Ourém manifestou o seu regozijo pelo culminar do processo e considerou este jantar como um momento importante depois das dificuldades do processo. Mas graças ao empenho das várias instituições e dos produtores alcançou-se o objectivo através do reconhecimento de um produto diferente e único que, segundo o presidente da Câmara, não deverá procurar competir com outros vinhos mas sim procurar alcançar um nicho de mercado especifico. Até porque não se espera que venha a haver uma tão grande quantidade no mercado, pelo menos para já.
Catarino aproveita ainda para falar na constituição nova empresa que pretende vir «responder à necessidade dos pequenos produtores», procurando, de algum modo, inverter a tendência de abandono das vinhas a que se vai assistindo, devido a dificuldades de colocação do vinho no mercado. Catarino diz que a câmara se empenha neste processo «de forma temporária». Isto porque «não é sua vocação fazer ou vender vinho», mas é-o, com certeza, «apoiar algo que é importante para o concelho». Refere a importância da presença do Director Regional de Agricultura e do Governador Civil como sinal positivo para os produtores e defende a continuidade de organização e participação dos produtores.
Termina reflectindo sobre a importância de uma agricultura que, sem ser de subsistência, permite acrescentar algum rendimento aos ordenados, ao mesmo tempo que leva a que mais facilmente se combata o desemprego.
O Governador Civil manifestou-se duplamente satisfeito: para além de oureense, faz parte dos corpos dirigentes da VitiOurém e defendeu, também ele, o vinho como bandeira sócio-cultural do concelho. E deixa o desafio para que «tenhamos a capacidade para fechar um capítulo e abrir outros». Isto porque, segundo Paulo Fonseca, «gastam-se muitas energias a falar do passado» quando «vivemos em tempos de mudança constante, no plano nacional e internacional». Por outro lado, aponta também a tendência para se olhar as coisas «de forma excessivamente doméstica», quando o mais importante é saber «dar as mãos», adquirindo assim dimensão e afirmando-nos pela diferença. «Não tenhamos ilusões», afirma o Governador Civil de Santarém, «se a visão for doméstica, o vinho não terá valor acrescentado». Por isso, defende, «é preciso dar força à VitOurém, à nova empresa e ao produto». Terminou deixando expressa a sua disponibilidade pessoal e institucional para dar o «contributo necessário para o engrandecimento deste produto».

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