08 março 2007

SAP encerra dia 16


Foi o tema da saúde e o encerramento do SAP - Serviço de Atendimento Permanente, de Ourém que registou maior descontentamento no decorrer da Assembleia Municipal do passado dia 28.
Fernando Afoito, coordenador da Sub-Região de Saúde de Santarém, foi o último dos convidados a intervir e confirmou os receios da população e dos deputados municipais. Afirmando que "não se irá efectuar nenhum encerramento do Centro de Saúde, mas sim um reajuste de horários que levará a um reforço das equipas diurnas e ao encerramento nocturno entre as 22 e as 8 da manhã". As palavras do responsável levantaram uma onda de burburinho na sala e levaram à indignação de David Catarino, que estranhou "a ausência de qualquer diálogo com a autarquia ou com a população sobre esta medida", sublinhando que "ainda hoje, telefonicamente me afirmaram que não havia nenhum encerramento". Perante a onda de indignação visível na sala Catarino terminou a sua intervenção referindo "não esperem que acatemos esta decisão calados e quietos".
A indignação continuou e a presidente da AM fez questão de apresentar também o seu protesto. Afirmando não ser «adepta de arruadas», Deolinda Simões diz ter convidado o coordenador «para ouvir a voz do povo». Por isso recorda a grandeza populacional e territorial do concelho, que o colocam como o 2º maior concelho do distrito, logo a seguir à sua capital, Santarém. É por isso que a presidente da Assembleia Municipal pergunta «como é possível que, a um concelho com um crescimento demográfico crescente, ao contrário de outros, nossos vizinhos, lhe seja ordenado o fecho, durante a noite, do único recurso a nível da Saúde?». Refere as dificuldades de acesso aos hospitais da região, dadas as más acessibilidades existentes e recorda que Ourém não é apenas a cidade, mas todo o concelho, que, dada a sua dispersão, obriga a que sejam feitos muitos quilómetros para chegar aos hospitais. Isto numa altura, recorda, em que «ainda não se sabe bem onde estão localizadas as várias valências» no que toca ao Centro hospitalar do Médio Tejo, distribuídas por Tomar, Torres Novas e Abrantes. «Já pensaram bem, o que acontecerá a cada um de nós, quando às três ou quatro da manhã tivermos que socorrer uma criança, sem sabermos ao certo para onde ir?», pergunta-se a presidente da Assembleia que considera que isso «será simplesmente desesperante senão diabólico». Por outro lado, refere os fluxos turísticos que trazem ao concelho milhões de pessoas anualmente que acabam por se traduzir em mais dormidas que aquelas que são exigidas para manter uma urgência aberta. A isto acresce-se a população emigrante que vem regularmente no Verão mas também noutras épocas do ano. Deolinda Simões reconhece, porém, as dificuldades vividas no Centro de Saúde de Ourém devido não só aos poucos médicos mas também ao seu envelhecimento. Daí que defenda a necessidade de serem encontradas soluções, através do diálogo e da concertação, em vez de «continuar a tomar decisões baseadas numa política economicista, unicamente fundamentadas em relatórios técnicos e médias aritméticas, sem descer ao terreno e ouvir as partes intervenientes».
Um dos momentos mais intensos aconteceu quando a deputada municipal, presidente da Junta de Freguesia de Gondemaria mas também médica no Centro de Saúde de Ourém, usou da palavra. Ana Abreu começou por atribuir culpas à direcção do Centro de Saúde de Ourém, considerando que não se tentaram encontrar as melhores soluções para o encerramento nocturno. Isto porque, em reunião recente com os médicos, o coordenador terá sugerido que o encerramento ocorresse às 24 e não às 22 horas. Mas «por acordo de todos nós – eu estava presente e não me vou descartar, embora não me tivesse manifestado – foi decidido encerrar às 22h00». Também a direcção do Centro de Saúde se insurge contra as acusações feitas na AM. A sua directora diz que «a pessoa que fez essas acusações esteve na reunião e não tomou a posição que defendeu depois na Assembleia Municipal». Quanto ao encerramento poder acontecer apenas à meia-noite, esta responsável diz que não lhe pareceu que houvesse essa possibilidade e que também os médicos não se manifestaram nesse sentido. Aliás, recorda que apenas um médico do Centro tem menos de 50 anos.
A melhor solução, para Cândida Alvarenga, passaria pela contratação de mais três médicos. E a coordenação regional até aceitaria, porém não há médicos para serem contratados. Recorda que quando se abre concurso, ninguém concorre e quando se consegue alguma contratação, os médicos em tal situação acabam por ficar cá pouco tempo. É que, segundo a médica, o Centro de Saúde a funcionar durante 24h00 acaba por retirar condições de trabalho aos médicos que, dadas as características do serviço, acabam por se sentir desapoiados, preferindo trabalhar em hospitais, inseridos em equipas.
«Uma palhaçada»
Mas é o modo de funcionamento do SAP que mais deixa indignada a médica, afirmando mesmo que «da maneira que está a ser implementado, o atendimento complementar é uma palhaçada». E explica. «De manhã vai funcionar com um médico que terá que dar resposta aos utentes todos que vêm dos postos onde há médico a funcionar mas que, por motivos de marcações prévias, só atendem quatro ou cinco vagas». Mas este médico terá ainda que atender «os utentes dos médicos do resto do concelho que estão em formação, em congressos ou de férias». Esse médico, de serviço entre as «8 e as 14h00 vai juntar lá uma "catrefada" de doentes. Eu sou testemunha porque faço isso à segunda-feira e quando saio às 14h00, ainda deixo lá doentes das 9h30 da manhã». Quanto à tarde, «vão funcionar, tal como eu costumo dizer, não dois médicos mas médico e meio». Isto porque «somos só quatro que vamos fazer o atendimento complementar e um médico contratado, que vai fazer todos os dias, e acompanhar esses médicos do quadro». Só que, continua a médica, «esse médico contratado nunca vem a horas, só trabalha quando lhe apetece e as pessoas, muitas vezes, recusam-se a ser atendidas por ele». Por tudo isto, Ana Abreu diz que «eu não sei trabalhar num serviço assim. Sou médica há 27 anos. Estou farta de trabalhar neste Centro de Saúde. Dou o meu melhor, faço o melhor que posso, mas não gosto de ser gozada nem gosto de ver a população que eu estou a servir, ser gozada». Diz ainda que «no meu ambulatório, faço o melhor que posso, com toda a gente. Não faço marcações prévias e não há reclamações». Por isso, «não admito que os meus colegas o façam e que os serviços de saúde estejam no estado em que estão, neste concelho».
À indignação da médica, o coordenador regional respondeu, também indignadamente, dizendo-lhe que deveria ter manifestado a sua posição na referida reunião.
À espera de certezas
Entretanto, ao NO chegou a informação de que as indicações que entretanto haviam sido transmitidas aos serviços administrativos, a cumprirem-se, poderiam complicar ainda mais a vida aos utentes. É que, às 20 horas, deveriam ser contados os utentes que estivessem na sala, sendo que entre as 20 e as 22h00 apenas deveriam ser atendidos 16 utentes, ou seja, 8 por cada médico de serviço. Isto é, os que chegassem depois das 20h00 e ultrapassassem o tal número 16, já não seriam atendidos.
Mas a directora do Centro de Saúde desmente categoricamente estas informações. Garante que «ninguém se atreveria a dar uma ordem dessas» que poria em causa «os direitos dos utentes e os nossos deveres». Afirma que «os médicos têm que atender todas as pessoas que estão na sala e encaminhá-las, se for caso disso». Mais, garante que ainda não foram dadas quaisquer ordens e nem sequer se fez escala para depois do dia 16, temendo que até lá possa haver alterações que obrigariam a refazer tudo.


Factos e números
- Ourém tem uma área de 416,6 Km2; 18 freguesias e é o maior concelho do distrito de Santarém.
- Nos censos de 2001, a população residente era de 46.216 habitantes, admitindo-se um aumento significativo nestes últimos seis anos, já que a variação da população do senso de 1991 a 2001, foi de 15%, acrescida da imigração que foi significativa no concelho, sobretudo dos países do leste europeu e do Brasil.
- A população inscrita no Centro de Saúde de Ourém é de 37.478 utentes, no de Fátima é de 11.974, o que perfaz um somatório de 49.452 utentes inscritos, não falando nos utentes esporádicos (ex.: emigrantes regressados e que não estão inscritos no C. Saúde).
- Existe fluxo sazonal de utentes nos meses de Verão, e nas épocas da Páscoa e Natal, dada a grande taxa de emigração do concelho.
- Grande afluência de turistas/ peregrinos a Fátima, sobretudo nos dias 12 e 13 de Maio e de Outubro, bem como todos os fins-de-semana.
- Fátima tem Centro de Saúde mas este não dispõe de capacidade para o atendimento dos utentes inscritos, que são enviados, sistematicamente, para o SAP do C. Saúde de Ourém.
- Fátima, como zona turística, não dispõe de alternativas no que respeita à saúde para os seus visitantes, recorrendo, estes também, ao SAP de Ourém.
- Na sede do Centro de Saúde de Ourém, existem 5223 utentes em lista de espera.
- O C. Saúde de Ourém conta com 18 médicos no quadro (12 em regime de exclusividade e 6 em regime de não exclusividade).
- Num total de 22 médicos, 21 têm idade superior a 50 anos.
- O C. Saúde de Fátima conta com 5 médicos, sendo que 3 têm idade superior a 50 anos.
- As instalações do C. Saúde de Ourém dispõem de:
- aparelho RX;
- ECG;
- Laboratório de análises, embora desactivado;
- Higienista oral;
- Equipamento de reanimação com desfribilhador, ventilador e carro de emergência;
- SO com 3 camas para internamentos de curta duração;
- Sala de aerossóis;
- Sala para tratamentos, pequena cirurgia e pensos;
- consultórios médicos.
O número de atendimentos médios entre as 8 e as 24 horas é de 116,2.
O número de atendimentos médios nocturnos, entre as 0 e as 8h00, é de 8,2.
Situações clínicas que ocorrem no SAP de Ourém
- consultas;
- acidentes de trabalho industriais; construção civil, madeiras e hotelaria);
- pequenos acidentes de viação e domésticos;
- situações de doenças súbitas de carácter urgente(crises hipertensicas; EHP (Estenose hipertrófica do piloro); AVC (acidente vascular cerebral); precordialgias; descompressões diabéticas, intoxicações; SDR (síndrome do desconforto respiratório), etc.
Todas estas situações têm sido atendidas no SAP, tendo, na maior parte delas, sido aí resolvidas, sem recorrer aos hospitais.
Feitas as estatísticas dos atendimentos entre Março de 2006 e Janeiro de 2007, conclui-se que, de todos os atendimentos, apenas uma média de 7% foi encaminhada para hospitais.
Alguns números
Em Janeiro deste ano foram atendidos, no Centro de Saúde de Ourém, um total de 4131 utentes, com a seguinte distribuição:
- das 0 às 8h00 – 306 utentes
- das 8 às 12h00 – 807 utentes
- das 12 às 16h00 – 970 utentes
- das 16 às 20h00 – 1165 utentes
- das 0 às 24h00 – 886 utentes
Destes, apenas 278 foram encaminhados para o hospital, o que equivale a 6,7%, enquanto os restantes 93,3%, foram situações resolvidas no C. Saúde.
Mas recuemos e vejamos o que se passa no Verão, com os dados referentes a Agosto do ano passado. Neste mês foram atendidos 4441 utentes, distribuídos do seguinte modo:
- das 0 às 8h00 – 345 utentes
- das 8 às 12h00 – 1015 utentes
- das 12 às 16h00 – 1048 utentes
- das 16 às 20h00 – 1108 utentes
- das 20 às 24h00 – 925 utentes
Destes, apenas 408 tiveram encaminhamento hospitalar, ou seja 9,1%, sendo que 90,9% dos casos foram resolvidos em Ourém.

Protesto

O presidente da Câmara de Ourém enviou já ao ministro uma carta a pedir uma reunião de urgência. Como os prazos são muito curtos (não esqueçamos que a decisão de encerramento entra em vigor já no próximo dia 16), caso o ministro não conceda esta audiência entretanto, o autarca deslocar-se-à a Lisboa para fazer a entrega em mãos. Nessa altura, um movimento de cidadãos está a organizar-se para acompanhar Catarino em acção de protesto. Se isso chegar a acontecer, a deslocação far-se-à por auto-estrada, a 45 km à hora e este movimento apela ao empenho da população para acompanhar esta viagem.
Também devido a prazos, o mais natural é que quando a edição da próxima semana chegar às bancas, os acontecimentos serão passado. Por isso, apelamos aos nossos leitores para que estejam atentos ao nosso blog. Sempre que haja novidades, dá-la-emos através do endereço, na Internet: http://www.noticiasourem.blogspot.com.

2 comentários:

Lobo Sentado disse...

Então, Aurélia? Sexta feira `noite e nada de novo?

Carlos Pereira disse...

Não sei quem é que idealizou este protesto, mas deveriam informar-se um pouco melhor sobre o codigo da estrada. É que andar a 45 km/h na auto-estrada é passivel de contra-ordenação dado que o a velocidade mínima de circulação é de 5O km/h.

Protestar sim, mas dentro das leis. Que circulem pelo menos a 55 km/h.